Falta de investimento em linha férrea fez Vale deixar o Estado após 46 anos

Mineradora chegou a fazer US$ 750 milhões de investimento em 2009; essa compra de ativos contribuiu para sua saída

Correio do Estado – A história ligando a Vale à exploração do minério de ferro e de manganês em Corumbá e Ladário vai chegar ao fim após 46 anos. Seu último grande investimento na região foi de US$ 750 milhões, porém a empresa não viabilizou estrutura logística para atuação.

Sua produção também não conseguiu gerar interesse para que a Rumo, que deveria manter a ferrovia em funcionamento, investisse para viabilizar o transporte pelos trilhos.

Ainda não se sabe efetivamente como ficará as mil vagas diretas que a empresa gera, além dos empregos indiretos.

A empresa mineradora, ainda estatal, integrava o consórcio que criou a Urucum Mineração S.A, em 1976. Então com o nome Companhia Vale do Rio Doce, ela diversificava sua ramificação concentrada em Minas Gerais.

Em 1994, antes de sua estatização (em 1996), ela adquiriu 100% das ações da Urucum Mineração. Foi, então, em setembro de 2009 que a mineradora privatizada tornou-se 100% proprietária da Mineração Corumbaense Reunida e ampliou sua atividade para o minério de manganês e domínio do minério de ferro.

A Rio Tinto era formada por um grupo anglo-australiano, mas tinha sido criada anteriormente por argentinos, nos anos de 1970.

Na época dessa aquisição, em 2009, a Vale pagou US$ 1,6 bilhão, porém os ativos de ferro em Corumbá custaram US$ 750 milhões, enquanto depósitos de potássio na Argentina e no Canadá foram de US$ 850 milhões.

Essa negociação incluiu a estrutura de exploração das minas a céu aberto em Corumbá, bem como a logística, incluindo o porto fluvial e as barcaças.

Foi justamente essa estrutura que, conforme apurado, levou a Vale a decidir desinvestir na região do Pantanal. Desde 2019, o Rio Paraguai passa por uma estiagem, impedindo a navegação comercial de ocorrer. Esse meio de transporte é o principal para a exportação do minério de ferro.

O custo de transporte ficou caro sem a utilização do rio por uma sequência de anos – agora, em 2022, vai somar quatro anos sem a navegação comercial em pleno funcionamento.

Com dificuldade para transportar sua produção, a opção foi dividir a carga pelo meio rodoviário e fluvial. O custo de fazer os caminhões trafegarem pela BR-262, porém, gerou diversos problemas.

Além da questão financeira, a Vale passou a ter sua imagem manchada diante das críticas de intenso fluxo de veículos.

A média de caminhões é de 300 por dia, pelo menos. O trecho entre Corumbá e Miranda não suporta essa carga passando todos os dias, por conta de sua fundação ter sido feita no meio do Pantanal e não dimensionada para os caminhões.

Desde 2019, esses caminhões seguem na rodovia para compensar a estiagem. O Rio Paraguai ficou inviabilizado para a navegação comercial por, pelo menos, seis meses em diferentes anos de seca mais intensa.

A Vale chegou a manter o movimento de barcaças no rio, porém transportando volume de carga que não permitia a conta da logística fechar.

A opção de contar com a ferrovia nunca foi viabilizada, desde a ampliação da Vale em Corumbá, em 2009. A privatização da Malha Oeste aconteceu na década de 1990, mas sem fiscalização, não houve os investimentos necessários.

Primeiro veio a Ferrovia Novoeste S.A, em julho de 1996. Em julho de 2008, a Novoeste passou a ser controlada pela América Latina Logística (ALL). Em 2015, houve processo de fusão da concessionária com a Rumo Logística. E, ao longo de 24 anos, nenhuma melhoria efetiva ocorreu.

Oficialmente, a Vale confirmou que a venda do Sistema Centro-Oeste foi definida para “simplificar” seu portfólio.

“Essa iniciativa de desinvestimento está em linha com a estratégia de simplificação de portfólio e foco nos principais negócios e oportunidades de crescimento, pautados pela alocação de capital disciplinada”, divulgou a mineradora, em comunicado para o mercado.

As minas em Corumbá estão longe de serem as mais rentáveis para a empresa. O Sistema Centro-Oeste é o que tem o menor volume em extração de minério de ferro diante das outras unidades.

Relatório trimestral apontou que 795 mil toneladas foram obtidas em Corumbá contra 50 milhões no Sistema Norte, 18,6 milhões no Sistema Sudeste e 12,9 milhões no Sistema Sul.

Além do cenário de logística deficitário, falta de investimento para viabilizar o escoamento da produção, a Vale ainda teve complicações na exploração subterrânea na mina Urucum.

Em 14 de outubro, houve um desplacamento de rocha em uma das galerias, que gerou perigo nas operações. Nenhum funcionário foi vitimado, mas as atividades estão paralisadas até hoje, cinco meses depois.

RISCO SOCIAL

A Vale não é a maior empregadora de Corumbá, mas figura entre as mais importantes, gerando mil empregos diretos, além dos indiretos.

Nos cargos de chefia, boa parte dos contratados são de fora, mas todo o restante da estrutura é absorvida no mercado local.

O fator empregos e movimentação nas compras do comércio local e financiamento de projetos, tanto em Corumbá como em Ladário, agora ficam na berlinda.

Os poderes públicos municipal e estadual figuram entre os atingidos por esse desinvestimento. Só a prefeitura de Corumbá recebeu, em 2021, R$ 33.895.877,15 em recursos oriundos da Compensação Financeira da Exploração de Recursos Naturais (Cfem). 

O Estado teve uma arrecadação de R$ 56.233.304,39 com exploração de ferro e R$ 6.649.080,89 referente ao manganês. Parte desses recursos foi paga pela Vale.

O titular da Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (Semagro), Jaime Verruck, reconheceu que há uma preocupação pelo fim de vagas de trabalho e redução na arrecadação.

Tanto ele como o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) têm acompanhado as tratativas de venda da Vale desde fevereiro deste ano.

“Quero tranquilizar os funcionários, nós não conhecemos quem será o novo operador, mas eu e o governador estamos tendo reunião com a diretoria da Vale. Discutimos muito, e é importante mencionar que querem manter o nível de operação, há uma necessidade de manter o atual nível de operação para garantir os empregos”, afirmou Verruck.

Negociação

Não se sabe a empresa que manterá os compromissos da Vale. Não houve divulgação de nomes na negociação.

Boatos indicam para a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e grupos do Canadá e da Inglaterra. Ao todo, 10 empresas estariam interessadas.

Operação no Terminal Porto Gregório Curvo, que fica no distrito de Porto Esperança, em Corumbá – Marco Calabria (reprodução Correio do Estado)

Fonte: Correio do Estado (https://correiodoestado.com.br/economia/com-logistica-falha-por-falta-de-investimento-vale-deixa-ms/398444)

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