Valor Econômico – Mineradoras investem em eficiência e escala para ganhar rentabilidade devido às incertezas da demanda mundial
Com oferta e demanda estabilizadas, os preços do minério de ferro no mercado internacional voltaram ao patamar pré-covid-19. Antes da pandemia, a cotação da tonelada do minério de ferro entregue na China estava na faixa dos US$ 90. A oferta recuou com os lockdowns em vários países para conter o avanço da doença, enquanto o mercado consumidor, puxado pela China, primeiro se retraiu e na sequência voltou com força. O desajuste na oferta levou os preços do minério a subirem até superar US$ 200 em junho de 2021. No fim de agosto de 2022, já havia recuado para a casa dos US$ 100 a tonelada.
O rali da commodity gerou aumento na receita das exportações brasileiras. Segundo o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), os embarques internacionais de minério de ferro em 2021 cresceram 4,7%, chegando a 341,6 milhões de toneladas. A receita com as exportações saltou 73,2%, para um total de US$ 44,6 bilhões.
“Os anos de 2020 e 2021 foram atípicos, hoje o mercado está bem menos estressado e os preços de volta a um patamar bom, não mais excelente”, diz o consultor Ronaldo Valiño, sócio da PwC Brasil. No primeiro semestre de 2022, o volume exportado, 154,4 milhões de toneladas, foi 7,5% menor em igual período de 2021, enquanto a receita obtida de US$ 15 bilhões teve queda de 30%.
Dois fatores explicam o baixo desempenho. Do lado da produção, fortes chuvas no primeiro trimestre afetaram a segurança e reduziram o desempenho operacional das mineradoras brasileiras em Minas Gerais e no Pará. Do lado da demanda, houve uma retração na produção de aço na China, de 6,7%, resultado de medidas adotadas pelo governo para conter a poluição do ar e lockdowns para controlar a covid-19 em várias regiões industriais.
A China é o destino de 65% dos navios graneleiros que transportam o minério de ferro brasileiro e responsável por 70% das compras globais. Em 2021, o país asiático produziu 1 bilhão de toneladas de aço, sendo responsável por 52,9% da produção global, segundo dados da World Steel Association.
Não existe clareza sobre o futuro da demanda de minério de ferro na China e no mundo, o que dificulta as projeções sobre o comportamento da commodity. O país asiático promove um ajuste em seu parque siderúrgico para conter o excesso de poluição e revisa seus planos de investimentos em infraestrutura e no mercado imobiliário.
No primeiro semestre de 2022, as autoridades monetárias de diferentes países aumentaram as taxas de juros para conter a inflação e reduziram o ritmo de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. Para a China, principal centro manufatureiro do mundo, significa menor espaço para as vendas globais de seus produtos. “A China não vai voltar a crescer 10% ao ano, mas continua crescendo e sua demanda determina o mercado internacional de minério de ferro”, diz o consultor Afonso Sartorio, líder de mineração América do Sul da EY.
Uma outra incógnita em relação ao mercado da China é sobre o papel que terá a nova estatal, a China Mineral Resources Group (CMRG), criada em julho deste ano, com o objetivo de coordenar as atividades minerais e de aço e com a função de negociar as compras globais de minério de ferro junto às grandes mineradoras e dos investimentos chineses em ativos minerais internacionais.
Nas perspectivas de longo prazo global há mais uma incerteza: o tamanho da demanda por aço em um mundo com padrões de consumo em transformação, com o avanço da economia compartilhada em segmentos importantes, como o automotivo e o de máquinas e equipamentos, e o aumento da relevância da pauta de sustentabilidade. Na siderurgia, ganha força o uso de metal reciclado em usinas mini-mills, que utilizam sucata ferrosa como insumo, e permitem uma redução significativa de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera.
“Diante de um cenário de incertezas, é natural que as mineradoras adotem um comportamento mais conservador e concentrem seus esforços em ampliar a produção em bons ativos onde já produzem. Não existem novos grandes projetos minerais em desenvolvimento”, diz Valiño.
A Vale, principal mineradora brasileira, promove em 2022 um ajuste em seus ativos com o objetivo de concentrar esforços nas operações com maior potencial mercadológico. Em abril, a empresa fechou a venda por US$ 1,2 bilhão do Sistema Centro-Oeste em Mato Grosso do Sul, que produziu 2,7 milhões de toneladas de minério de ferro e 200 mil toneladas de manganês em 2021. O negócio marca a entrada do Grupo J&F, dona dos frigoríficos JBS, no mercado mineral. A Vale também acertou em julho a venda da Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP), em São Gonçalo do Amarante (CE), com capacidade de 3 milhões de toneladas de placas de aço por ano, para a ArcelorMittal.
Por outro lado, a empresa investe na ampliação da produção em seu principal ativo de minério ferro em Canaã dos Carajás, no Pará. No fim do primeiro semestre, recebeu a licença de instalação para a implementação do Projeto Serra Sul 120. O investimento de US$ 1,5 bilhão prevê aumentar a partir de 2024 em 20 milhões de toneladas anuais as capacidades da mina e usina S11D, que passará a um total de 120 milhões de toneladas anuais.
Em 2022, o “guidance” da Vale é de uma produção entre 310 milhões e 320 milhões de toneladas de minério de ferro. A meta é chegar a uma capacidade de produção de 400 milhões de toneladas em 2024. “É um nível para correr atrás. Vai depender se o mercado precisa ou não. Hoje, não há necessidade”, diz Marcello Spinelli, vice-presidente executivo de ferrosos da Vale. “Não vamos trazer nada a mais do que aquilo que o mercado precisa.”
A Bahia Mineração (Bamin) decidiu ampliar seu projeto de exploração na Mina Pedra de Ferro, em Caetité (BA). A produção, que teve o início de sua operação comercial no fim de 2020, atingiu 1 milhão de toneladas em 2021. A meta inicial era expandir gradualmente a capacidade produtiva até 18 milhões de toneladas em 2026. O total foi revisto e a nova meta é uma produção de 26 milhões de toneladas anuais naquele ano. “Temos um minério de altíssima qualidade, que está sendo demandado, mas precisamos de escala para sermos mais competitivos”, diz o CEO Eduardo Ledsham.
Para ser classificado como um minério de boa qualidade, o teor férreo precisar superar 62%. Quanto mais puro o minério, menor necessidade de carvão no processo produtivo do aço e menor a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera. O minério processado pela Bamin apresenta pureza de 67,5% e a companhia trabalha para chegar a 68%. A demanda por minério de alta qualidade é maior que a oferta no mercado global. “Conseguimos um premium de 15% a 20% na comercialização de nosso minério”, diz Ledsham.
Para alcançar a nova capacidade produtiva, a Bamin vai ampliar em US$ 1 bilhão seus investimentos, que chegarão a US$ 4 bilhões. Os recursos contemplam a infraestrutura de lavra e processamento e também a logística necessária para embarcar o minério em Ilhéus (BA). A empresa está construindo o Trecho 1 de 537 quilômetros da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), ligando as baianas Caetité e Ilhéus, onde está erguendo um terminal portuário, o Porto Sul, com capacidade para movimentar 42 milhões de toneladas de cargas anuais e contará com um terminal para minério e outro para grãos.
A Anglo American anunciou um investimento de R$ 4,4 bilhões até 2025 no sistema produtivo Minas-Rio, que tem bases em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas (MG) e um sistema logístico até o Porto de Açu, em São João da Barra (RJ). “O foco dos investimentos é a tecnologia, são melhorias operacionais e automação de processos com o objetivo de gerar ganhos de performance nos equipamentos e mais segurança”, diz Wilfred Bruijn, o Bill, como é conhecido no meio mineral o presidente da companhia no Brasil.
Uma parcela dos recursos, US$ 60 milhões, será utilizada para a implementação de um sistema de separação magnética para captar partículas de ferro nos resíduos do processamento, a sobra do material que é encaminhado às barragens de rejeitos. “O reprocessamento do material deverá gerar um incremento da produção em 1 milhão de toneladas por ano”, afirma Bill. Outra vantagem é o aumento da vida útil e da segurança da barragem, com a redução do material depositado.
A separação magnética dos rejeitos estará em operação plena a partir de 2023 e permitirá o sistema Minas-Rio alcançar uma capacidade produtiva de 26,5 milhões de toneladas. “Nosso minério tem um teor de ferro na casa de 67%. É um produto de alta qualidade, com grande aceitação. Tudo que produzimos, vendemos”, diz Bill. O “guidance” da empresa no início de 2022 era uma produção de 24 milhões a 26 milhões de toneladas. Após as fortes chuvas que afetaram Minas Gerais no primeiro trimestre do ano, foi revisto para 22 milhões a 24 milhões de toneladas. “Desde maio alcançamos uma estabilidade produtiva, e a projeção é de um segundo semestre bem melhor que o primeiro”, destaca.
A comercialização de minério de ferro no mercado interno não é muito expressiva, porque as principais siderúrgicas integradas no Brasil possuem minas de ferro próprias. O Ibram contabiliza uma comercialização entre companhias de 65,5 milhões de toneladas de minério de ferro no Brasil em 2021. No ano passado, a produção de aço bruto no país cresceu 14,8% e somou 36,1 milhões de toneladas. Em 2022, até o mês de julho, a produção de 20,3 milhões de toneladas de aço representou uma queda de 3,5% ante igual período de 2021.
Na indústria do aço brasileira, a expectativa é de um crescimento no consumo nos próximos anos. Para se adequar à esperada expansão da demanda, as siderúrgicas do país executam investimentos de R$ 11,9 bilhões em 2022 e possuem no pipeline de projetos para os próximos quatro anos outros R$ 40,6 bilhões, segundo o Instituto Aço Brasil.
Fonte: Valor Econômico (https://valor.globo.com/empresas/noticia/2022/09/12/setor-ajusta-meta-de-producao.ghtml)
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