Governo pretende facilitar concessão de ferrovias a investidores ao mudar regras de exploração. Senadores cobram participação de MG em recursos em novo contrato da FCA
O Projeto de Lei do Senado (PLS) 261/2018 estava pronto para ser votado, mas voltou a ficar parado na Casa. O texto cria o novo marco regulatório das ferrovias, prevendo novas regras para exploração dos trilhos e construção de novos trechos. O tema foi definido como um dos prioritários pelo governo federal para a retomada econômica. A tramitação do texto foi travada por conta de impasses na renovação da concessão da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), a maior do país.
Com mais de 7.000 km de extensão, a via atravessa as regiões Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste para o transporte de cargas e é administrada pela VLI. Para renovar o contrato, o governo exige como contrapartida R$ 13,6 bilhões em investimentos. Porém, conforme o senador mineiro Carlos Viana (PSD), não está prevista a aplicação dos recursos em melhorias no corredor Centro-Leste, que sai de Anápolis (GO), passando pelo Triângulo Mineiro e pelas regiões Central e metropolitana, até o porto de Vitória (ES).
“Esse corredor vai ficar isolado, e ele é muito importante para o desenvolvimento das nossas cidades. No acordo, também não estão previstos investimentos compensatórios para os municípios onde a linha é um transtorno, e a maior parte do dinheiro vai para o corredor São Paulo-Goiás-Mato Grosso, que já vem recebendo investimentos do governo e foi privilegiado no primeiro acordo de antecipação da Ferrovia Vitória-Minas”, explicou o senador Carlos Viana (PSD-MG).
De acordo com o parlamentar, a expectativa é que o projeto das ferrovias só seja apreciado depois que o Ministério da Infraestrutura garantir que os investimentos sejam aplicados em Minas Gerais. Ontem, foi criado um grupo de trabalho para negociar o tema com a pasta.
Enquanto o impasse não é resolvido, o setor ferroviário fica na expectativa pela aprovação do projeto, que tem relatoria do senador Jean Paul Prates (PT-RN). A proposta prevê mudanças no regime de exploração das ferrovias, que atualmente é concedida através de licitações e leilões, com diversas obrigações para as companhias. Caso o novo marco regulatório seja aprovado, a malha poderia ser operada por autorização, em que a empresa envia um projeto diretamente ao governo federal.
“Estamos reconhecendo que há um grande espaço para que essa modalidade de transporte possa operar com benefício da liberdade de empreender, mas que, em contrapartida, os obriga a assumir todos os investimentos e todos os riscos do negócio”, avalia Prates. Os contratos devem ter duração entre 25 e 99 anos, com possibilidade de serem renovados.
Ao todo, o país conta com mais de 30 mil quilômetros de ferrovias atualmente. Dados do Ministério da Infraestrutura apontam que 10 mil quilômetros estão ociosos. Por isso, o projeto também prevê chamamentos para identificar investidores interessados em explorar os trechos, com a possibilidade de retirada da concessão dos atuais operadores.
O Ministério da Infraestrutura informou que vai considerar “todas as ponderações e sugestões feitas” para definir os investimentos em contrapartida à renovação do contrato da FCA. A Agência Nacional de Transportes Terrestres declarou que vai iniciar a análise de todas as contribuições para identificar “a necessidade de novos investimentos não contemplados nos estudos”
Primeiro passo é valorizar o turismo
A presidente da ONG Amigos do Trem, Cyntia Nascimento, afirma que o projeto busca desburocratizar o setor e tornar os processos mais rápidos e eficientes. “Tenho certeza de que será um facilitador para a revitalização e a exploração de trechos ociosos como também o uso democrático dos trechos ativos”, disse. Para ela, quando ocorreu a privatização da rede ferroviária, os trechos menos lucrativos foram deixados de lado pelas concessionárias, o que levou ao abandono de quase 34% da malha.
“A solução para a valorização e a revitalização de trechos, no nosso ponto de vista, passa pela exploração do potencial turístico das áreas e a atração que o passeio de trem ainda tem capacidade de aguçar no público. Após esse primeiro passo, pode, sim, pensar em explorar o transporte de cargas”, enfatizou Cyntia.
Já o diretor executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), Fernando Paes, defende mudanças no texto para não prejudicar as empresas que já atuam no setor. “Para não provocar um desequilíbrio, seria imprescindível criar regras para que as concessionárias possam trocar de regime, caso queiram. O próprio relator se mostrou sensível a isso, mas o que faltava era um acordo”, disse o especialista.
“O texto passa longe das necessidades do país”
O professor da UFMG e coordenador do movimento Minas-Trilhos, Antônio Augusto Moreira de Faria, afirma que o projeto não prioriza o transporte de passageiros pelos trens, tema considerado essencial para reduzir a dependência das rodovias.
“O texto passa longe das principais necessidades do país, que é uma articulação equilibrada entre o transporte de passageiros e o de cargas. O marco simplifica alguns aspectos, mas não foi pensado para isso”, argumentou.
Segundo o especialista, atualmente os trilhos só são utilizados para o transporte de commodities, principalmente o minério de ferro e a soja. “Entre BH e São Paulo, por exemplo, existe uma ferrovia de primeiro mundo que só é usada para o mineral. Ela podia transportar pessoas entre a capital mineira, o Rio de Janeiro e a capital paulista. Essa foi uma das falhas da concessão, que não cedeu as ferrovias para empresas de transporte”, finalizou.
Fonte: O Tempo (https://www.otempo.com.br/politica/projeto-quer-destravar-ferrovias-mas-tramitacao-esta-parada-no-senado-1.2451037#)
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