Rumo leva o principal trecho da Ferrovia Norte-Sul com o dobro do lance mínimo

Empresa pagou R$ 2,7 bi pela ferrovia no primeiro leilão do setor dos últimos 12 anos

 

A Rumo venceu nesta quinta-feira, 28, o leilão da Ferrovia Norte-Sul com lance de R$ 2,7 bilhões, ágio de 100,92% superior ao valor mínimo definido pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Bem acima do segundo colocado, a proposta deu à empresa o domínio do cinturão agrícola do Centro-Oeste, que hoje já tem parte da produção atendida pela empresa do grupo Cosan. O resultado fez as ações da companhia subirem 4,4% na Bolsa.

 

O leilão, de 1.537 quilômetros (km) entre Porto Nacional (TO) e Estrela d’Oeste (SP), ocorreu nesta quinta-feira, 28, na B3, em São Paulo, sob uma série de questionamentos na Justiça em relação ao edital. Apesar de várias ações pedirem o cancelamento da licitação, o governo conseguiu blindar o evento e licitar a ferrovia, iniciada há mais de 30 anos.

 

“O resultado foi excelente e superou as expectativas do governo”, afirmou o ministro de Infraestrutura, Tarcísio Freitas. “É a terceira semana seguida de leilão e a terceira vez que temos nossas expectativas superadas.” Segundo ele, o mais importante é que agora o País terá a ligação do Porto de Itaqui (MA) ao Porto de Santos (SP), que é a espinha dorsal brasileira.

 

Apesar de o resultado positivo, a Norte-Sul teve apenas duas propostas. Além da Rumo, a concorrente VLI participou da licitação, mas perdeu com lance de R$ 2 bilhões e ágio de 52,6%. A empresa, que tem como sócias Vale, Mitsui e Brookfield, detém a concessão do primeiro trecho da Norte-Sul, leiloado em 2007, entre Açailândia (MA) e Porto Nacional (TO). Na ocasião, a Vale participou sozinha do leilão e venceu sem nenhum ágio.

 

Desta vez, a disputa contou com o apetite da Rumo, que já detém a maior malha ferroviária do País, com 12 mil km de trilhos. A empresa terá de investir R$ 2,7 bilhões, o que inclui a conclusão do trecho sul da ferrovia. Além disso, será responsabilidade dela fazer as correções nos trechos já concluídos pela estatal Valec.

 

Nos últimos anos, o próprio governo detectou problemas com os materiais usados pela estatal na construção da ferrovia. Os trilhos chineses, por exemplo, foram considerados inadequados para o transporte de carga, o que pode reduzir sua capacidade. Até a brita usada na estrada de ferro não está de acordo com as normas técnicas, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU).

 

De acordo com Julio Fontana, presidente da Rumo, esses pontos vão exigir auditoria para avaliar a extensão dos problemas. “Precisamos concluir a construção da ferrovia, olhar os pontos em que houve problema de construção, fazer correções e tocar a vida”, afirmou ele, que espera ter um retorno do investimento num curto espaço de tempo.

 

De acordo com o edital, a demanda estimada para a Ferrovia Norte-Sul é de 1,7 milhão de toneladas até 2020, chegando a 22,7 milhões em 2055. “O efeito não será imediato, mas a ferrovia tem capacidade para elevar em 15 vezes o volume atual de transporte”, disse Paulo Resende, professor da Fundação Dom Cabral. “Quem vence passa a dominar o escoamento da soja e do milho do Centro-Oeste, o cinturão agrícola brasileiro.”

 

Freitas destacou que as concessões ferroviárias não devem parar na Norte-Sul. Segundo ele, o governo está em processo avançado para enviar ao TCU os estudos da Ferrovia Oeste-Leste e da Ferrogrão, projeto que também vai explorar o transporte de grãos do Centro-Oeste. “Podemos fazer novos leilões ainda neste ano”, disse ele, que minimizou a polêmica em torno do direito de passagem. A regra permite que o operador de uma ferrovia passe nos trilhos de outra concessionária. Alguns investidores diziam que a legislação não era adequada.

 

Pelo Twitter, a senadora Katia Abreu (PDT-TO), ex-ministra da Agricultura, criticou a concessão: “O edital do leilão realizado hoje (quinta-feira, 28) tira a competitividade do frete porque não há concorrência. O monopólio prejudicará produtores rurais, que contavam com o direto de passagem para escoarem a produção.”

Rumo Logística

 

Criada pelo Grupo Cosan em 2008, a Rumo é a maior operadora logística com base ferroviária independente do Brasil desde a fusão com a América Latina Logística (ALL), em 2015. Recentemente, a empresa divulgou estimativa de Capex (investimento) para o período entre 2019 e 2023 de R$ 13 bilhões a R$ 15 bilhões, quase o dobro do estimado pelo mercado. Nesta quinta-feira, a empresa ofereceu R$ 2,719 bilhões e venceu a disputa pelo trecho central da Ferrovia Norte-Sul que será concedida por 30 anos.

 

Com quatro concessões nas mãos, que somam aproximadamente 12 mil quilômetros de extensão em linhas férreas, a rede ferroviária da Rumo é integrada por 1 mil locomotivas, 25 mil vagões, além de centros de distribuição e instalações de armazenamento. Em 2017, a empresa decidiu abrir capital e desde então é listada no Novo Mercado da B3.

 

A renovação antecipada da concessão da Malha Paulista, que vence em 2028, é um tema sensível para a empresa, pois poderia destravar novos investimentos inclusive para a Malha Sul. São 2.039 quilômetros de extensão que juntamente com sua malha ferroviária do Centro-Oeste compõe um dos principais corredores de exportação do país, ligando a região ao Porto de Santos (SP). O processo está em fase final de análise no  TCU.

 

As concessões das malhas Oeste (com 1.951 quilômetros) e Sul (com 7.208 quilômetros) vencem em 2026 e 2027, respectivamente, e sua renovação já foi solicitada.

 

O vencimento da Malha Norte, de menor extensão (735 quilômetros), será em 2079. O projeto de extensão dessa malha até Sorriso (MT), que ainda depende de aprovação regulatória da ANTT, é outro ponto importante de atração para investidores, segundo analistas.

 

Em recente evento, Marcos Lutz, presidente da Cosan, controladora da empresa, afirmou que seguirá com investimentos recorrentes na Malha Sul, enquanto aguarda a renovação do contrato de concessão. “Eu só posso fazer um investimento transformacional na Malha Sul depois de ter a renovação da malha acordada pelo governo, se não esse investimento não se paga”, afirmou.

 

Fonte: O Estado de S.Paulo/Fabiana Holtz e Bárbara Nascimento

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